Nascia, há cerca de 2020 anos, no Oriente Médio, um dos maiores líderes políticos e religiosos que a Terra já conheceu. Numa época em que o ódio ditava o tom dos debates, esse rabino da cidade de Nazaré ousou dizer que devemos amar nossos inimigos. Numa época em que a xenofobia e o preconceito eram extremos, ele abraçou estrangeiros, leprosos e prostitutas e ousou dizer que devemos amar nossos vizinhos como amamos a nós mesmos. Irritou, assim, os líderes políticos e religiosos de seu tempo, que alimentavam o ódio entre os destituídos para manter seu status social. Os oprimidos estavam muito ocupados odiando a si mesmos para perceber o quão explorados estavam sendo por religiosos hipócritas e seus aliados da potência invasora.
Além disso, o rabino defendia a igualdade social. Ele ensinou a seus seguidores a dividir o pão. Disse a um jovem rico que queria segui-lo: vá e dê tudo o que possui aos pobres. Logo o jovem entusiasta perdeu o interesse em acompanhá-lo. É fácil agir como um hipócrita e querer levar uma vida simples quando, no final da jornada, se tem uma casa confortável para onde voltar. Não são com essas pessoas que devemos nos preocupar, ensinou o rabino. O reino dos céus não pertence a elas; é mais fácil um camelo passar pelo olho de uma agulha do que um rico entrar no céu, disse certa vez. Pouco antes de morrer afirmou que a doação vinda de quem tira de suas necessidades é muito mais digna de graça do que a oferta de quem tira do supérfluo.
Continuamos a matar Jesus todos os dias, enquanto lembramo-nos de sua morte na Páscoa. |
Conforme seu número de seguidores crescia, irritava os possuidores do monopólio da espiritualidade e da política na Palestina, ou seja, os fariseus (preocupados com a exposição de sua hipocrisia) e os romanos (preocupados que seu modelo alternativo resultasse no fim do pagamento de impostos). Não podiam aceitar a concorrência de um simples carpinteiro iletrado, ouvido, aclamado e seguido pelas massas destituídas. Forjaram-lhe, então, um julgamento político, uma farsa com o intuito único de condenar-lhe. O responsável pelo julgamento sequer entendeu o crime do acusado e tentou libertar-lhe, mas acabou preferindo sentenciar-lhe à morte para não dar margem para uma revolta dos justiceiros que, raivosos, gritavam na porta de seu palácio: "crucifique-o".
Na cruz, o rabino perdoou os pecados de um bandido antes de falecer. Jesus morreu como ele e como qualquer ladrão de celular que é linchado até a morte por turbas nos rincões do Brasil. Foi condenado sem provas e feito de bode expiatório para servir de lição a rabinos radicais assim como Rafael Braga, jovem negro condenado por carregar um garrafa de Pinho Bril na mochila durante as manifestações de junho de 2013. Jesus foi executado sumariamente como Manuel Fiel Filho, que defendia ideias tão perigosas para o poder dominante de sua época quanto ele. Dito isso, tenho a convicção de que Jesus é um desses bandidos bons dos quais os comentaristas histriônicos de tevê falam. Jesus é um bandido bom porque é um bandido morto. E continuamos a matá-lo, todos os dias, enquanto lembramo-nos de sua vida e morte durante a quaresma. Amém?
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