O comunismo, enquanto ideologia utópica, nunca matou nenhum ser humano. A grosso modo, o comunismo é o estágio final da revolução socialista, onde todas as desigualdades socioeconômicas desapareceriam e os indivíduos seriam plenamente iguais em direitos e deveres. Desapareceriam as classes sociais. Isso jamais ocorreu nos países ditos socialistas. Em Cuba, na China e na União Soviética, o que se verificou foi a divisão da sociedade em duas classes: os líderes e os liderados. Segundo Marx e Engels, o comunismo promoveria o desaparecimento do Estado nacional, que se tornaria obsoleto para organizar a sociedade. Com a propriedade coletiva dos meios de produção, o que acabaria com a exploração do homem pelo homem, torna-se desnecessária a existência de um Estado para mediar conflitos e impor obrigações.
Segundo os manifestantes do dia 13, eles são tão heroicos quanto o homem do tanque. Só que Dilma não declarou lei marcial e nem proibiu as eleições no Brasil. |
Diversas vertentes do comunismo emergiram após a Revolução Russa, mas, na prática, nenhum Estado dito comunista atingiu a meta marxista de socializar os meios de produção, ou seja, dar aos trabalhadores o controle dos mesmos. No máximo promoveram a nacionalização deles. Por esta razão, diversos grupos marxistas se referem aos comunistas soviéticos e chineses não como comunistas, mas sim como capitalistas de Estado. Outro termo bastante utilizado para descrever os regimes comunistas é socialismo real, termo que denota a diferença substancial desses regimes em relação ao socialismo ideal. De fato, a China, o maior país dito comunista da atualidade, em nada lembra o ideal marxista: os chineses podem abrir empresas privadas e estrangeiros podem investir no país. Ainda não conheci turistas mais consumistas do que os chineses.
Paralelamente a isso, a repressão é brutal como na antiga União Soviética. Em abril de 1989, em meio à queda dos regimes comunistas no Leste Europeu e a uma crise inflacionária, milhares de estudantes e trabalhadores saíram às ruas para exigir o retorno da liberdade de imprensa e de expressão e da coletivização das fábricas. No auge dos protestos cerca de um milhão de pessoas ocuparam a Praça da Paz Celestial em Pequim. Inicialmente o governo chinês, liderado por Deng Xiaoping, optou por adotar um tom conciliatório com os manifestantes, mas acabou decidindo apelar para a força bruta quando os protestos se espalharam para mais de 400 cidades em meados do mês de maio. A lei marcial foi declarada em 20 de maio e cerca de 300.000 tropas foram deslocadas para a capital com o intuito de desocupar a praça.
Entre os dias 3 e 4 de junho, o Exército de Libertação do Povo começou a desocupar o local, provocando a morte de 202 manifestantes segundo as Mães da Praça da Paz Celestial. O que se seguiu após a desocupação foi a expulsão dos jornalistas estrangeiros, um maior controle sobre a mídia local e a prisão dos manifestantes e seus apoiadores. Como resultado das imagens veiculadas internacionalmente — a mais famosa delas sendo a de um homem desconhecido que, voltando das compras, se posicionou na frente de um tanque de guerra —, o governo Xiaoping foi condenado e embargado pelas principais potências estrangeiras. É interessante notar que os manifestantes não eram necessariamente adeptos de uma ideologia de direita, como o social-democrata Wu'erkaixi (que se refugiou em Taiwan) e os membros da Nova Esquerda chinesa Kong Qingdong, Shen Tong e Wang Hui.
Essa era a mídia à disposição dos estudantes chineses. |
Os brasileiros não sabem o que é comunismo. Nem na teoria e nem na prática. Os chineses, por sua vez, sabem. Na pele. Por respeito às verdadeiras vítimas do comunismo, os camisas amarelas deveriam refletir muito antes de abrir a boca para se comparar às vítimas do comunismo. Porque eu tenho certeza absoluta que os protestos da Praça da Paz Celestial não foram convocados via outdoors e nem contaram com a ampla divulgação e cobertura da mídia local. O sofrimento dos chineses era real. Não estavam na rua porque queriam a baixa do dólar para que pudessem viajar para Miami. Não estavam revoltados porque o candidato deles perderam a eleição — queriam votar. Ainda me lembro de quando contei para uma chinesa como era o processo eleitoral brasileiro e ela arregalou os olhos para mim como se eu falasse grego. Empatizei-me com ela, assim como empatizo-me com os que estão presos por terem ousado lutar pela democracia na China. No entanto, parece que é demais exigir empatia daqueles que não possuem nem conhecimento básico de História.
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