Alguns acontecimentos do último final de semana me levaram a indagar se existe uma verdadeira renovação das ideias políticas ou se, no final das contas, continuamos todos dentro do mesmo espectro esquerda–direita que os membros dos États-Généraux de 1789 se encontravam. Na Assembleia Geral convocada pelo rei Luís XVI, aqueles que se sentavam à esquerda do monarca se opunham ao modelo social estabelecido (à época a monarquia absolutista) e defendiam uma revolução que trouxesse a secularização e a criação da República francesa, enquanto aqueles que se sentavam à direita do rei defendiam a manutenção do sistema de governo e do catolicismo romano como única religião oficial do Estado francês. Dessa forma, pode-se dizer que a nomenclatura "esquerda" nasceu atrelada à ideia de reformulação das estruturas sociais, enquanto que a noção de "direita política" surgiu associada à ideia de manutenção do status quo. Com o passar dos anos, no entanto, a esquerda foi assumindo uma postura menos revolucionária e a direita tornou-se menos troglodita. Tudo isso para arregimentar eleitores, o que provoca a sensação de que diferem pouco uma da outra.
História à parte, o primeiro acontecimento que me levou a questionar se há ou não renovação do espectro político foi a edição da revista Época lançada na sexta-feira e ainda hoje nas bancas. A publicação traz, como matéria de capa, uma reportagem sobre a "nova" direita e a "nova" esquerda. Imagino que a matéria traga opiniões que corroborem a visão de que direita e esquerda tenham caminhado cada vez mais para o centro do espectro político, usando como exemplo o universo particular de PT e PSDB. Acompanhando a reportagem, há no site da revista um teste que revela ao internauta se ele pertence ao "novo" ou ao "velho" espectro político. Fiz o teste e, por defender uma maior participação do estado na economia, fui comparado a ninguém menos do que o líder revolucionário cubano Fidel Castro. Achei o resultado um disparate. Nem toda figura histórica que defende uma maior participação do Estado na economia é revolucionária – ou sequer de esquerda. Ditadores de direita como Adolf Hitler e Benito Mussolini eram estatistas, assim como figuras da esquerda democrática como o economista britânico John Maynard Keynes. A quem interessa dizer que defender um maior controle da economia pelo Estado é uma ideia "velha"? A única resposta possível para essa pergunta é: aqueles que se beneficiam da desregulamentação dos mercados.
Já no sábado meu irmão me surpreendeu com uma revista que estava sendo distribuída no parque perto aqui de casa, que todo final de semana é tomado por "irmãos" das mais diversas denominações cristãs para fazer proselitismo religioso. Tratava-se de uma publicação de quase um milhão de exemplares da Igreja Adventista do Sétimo Dia sobre as diversas formas de parafilia (distúrbios sexuais). Não surpreendentemente para mim, a homossexualidade era apresentada como um desvio sexual ao lado da pedofilia e da necrofilia. No entanto, desde 17 de maio de 1990, ou seja, há mais de 25 anos, a autoridade suprema em questões de saúde pública no mundo, a Organização Mundial de Saúde (OMS), não considera mais a homossexualidade como uma doença. Em 1984, a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) posicionou-se contra a homofobia e, no ano seguinte, foi a vez do Conselho Federal de Psicologia (CFP) fazer o mesmo. Uma resolução do CFP datada de 1999 proíbe o tratamento da homossexualidade por psicólogos. Um deputado do meu estado pretendia sustar essa resolução do CFP, embora não seja da alçada do Congresso Nacional legislar sobre questões definidas internamente pelos conselhos de categorias profissionais.
Já no sábado meu irmão me surpreendeu com uma revista que estava sendo distribuída no parque perto aqui de casa, que todo final de semana é tomado por "irmãos" das mais diversas denominações cristãs para fazer proselitismo religioso. Tratava-se de uma publicação de quase um milhão de exemplares da Igreja Adventista do Sétimo Dia sobre as diversas formas de parafilia (distúrbios sexuais). Não surpreendentemente para mim, a homossexualidade era apresentada como um desvio sexual ao lado da pedofilia e da necrofilia. No entanto, desde 17 de maio de 1990, ou seja, há mais de 25 anos, a autoridade suprema em questões de saúde pública no mundo, a Organização Mundial de Saúde (OMS), não considera mais a homossexualidade como uma doença. Em 1984, a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) posicionou-se contra a homofobia e, no ano seguinte, foi a vez do Conselho Federal de Psicologia (CFP) fazer o mesmo. Uma resolução do CFP datada de 1999 proíbe o tratamento da homossexualidade por psicólogos. Um deputado do meu estado pretendia sustar essa resolução do CFP, embora não seja da alçada do Congresso Nacional legislar sobre questões definidas internamente pelos conselhos de categorias profissionais.
Mas o que isso tem a ver com a "nova" política? A revista dos adventistas trazia uma linguagem dinâmica, entrevistas com profissionais da psiquiatria e, pasmem, até uma citação de Martin Luther King, talvez o líder político mais progressista dos Estados Unidos do século passado: um pastor que se dizia socialista. Vale notar que a viúva dele, Coretta Scott King, militava pelos direitos dos LGBTs e, ao ser criticada por pastores negros, afirmou que seu marido teria feito o mesmo e que a mensagem dele defendia a igualdade para todos. A publicação também associava a queda de Sodoma e Gomorra à homossexualidade, embora a narrativa bíblica associa-a ao estupro. Manipular falas e escritos é uma das formas pelas quais a dita "nova direita" – seja ela religiosa ou não – pretende tornar seu discurso hegemônico na sociedade. A direita traveste-se de "progressista" para dar eco às suas ideias na sociedade. Ideias que, invariavelmente, defendem a manutenção de vários aspectos da ordem social vigente. Como pode uma direita ser "nova" se ela continua defendendo um sistema político-econômico que oprime quem está na base da pirâmide para garantir a fortuna daqueles poucos que estão no topo?
Outro fato recente que me chocou foi uma publicação que vi numa página anti-homofobia do Facebook pedindo que seus seguidores se juntassem aos protestos contra a presidente Dilma Rousseff no último dia 16. A justificativa para tal demanda era o aumento da violência trans-homofóbica durante o governo dela, embora a segurança pública seja uma responsabilidade dos estados e do DF. É verdade que Dilma prometeu se esforçar pela aprovação do PL 122, que criminaliza a homofobia, no atual mandato. Mas também é verdade que os brasileiros elegeram o Congresso mais conservador desde 1964, sob o qual a presidente exerce pouca influência. Uma pessoa LGBT discordar da agenda política da presidente é um direito dela. No entanto, uma pessoa LGBT marchar ao lado de quem tem o homofóbico Jair Bolsonaro como exemplo de ética na política é suicídio. Mas é assim que a "nova" direita consegue adeptos: através da desonestidade intelectual. Aproveitam-se do fato de que o brasileiro médio é limitado em termos de leitura e tem uma visão estreita e por vezes interesseira da conjuntura política, para arregimentar adeptos. Engrossam suas fileiras semeando a confusão ideológica. No fundo, esquerda e direita são as mesmas de sempre. Os discursos para arregimentar "fiéis" é que mudaram.
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