domingo, 26 de julho de 2015

A Argentina sempre superando o Brasil

Lulismo desaba. Kirchnerismo sobrevive.
Ao buscar um modelo de desenvolvimento social, o Brasil deveria olhar mais para seus vizinhos do sul como a Argentina e o Uruguai e menos para as diretrizes que vêm do norte. No atual momento, os petistas deveriam se perguntar: porque o lulismo desaba e o kirchnerismo ainda se mantém de pé? Desde o início, o movimento político dos hermanos se apresenta como uma oposição à "terceira via" (conservadorismo econômico e liberalismo social) imposta por Tony Blair e Bill Clinton aos partidos de centro-esquerda, com a qual tanto PSDB quanto PT flertaram em seus anos na presidência. Ao invés de tentar governar com os poderes pré-estabelecidos - alguns deles paraestatais - o kirchnerismo bateu de frente com as cercas que impediam o aprofundamento da democracia argentina (sistema financeiro internacional, Judiciário, Igreja Católica e mídia). Mais importante do que projetar a imagem do país no exterior através da celebração de grandes eventos, o kirchenerismo percebeu que só conseguiria se manter no poder se mexesse nas estruturas da sociedade argentina. Ou seja, perceberam que tentar a conciliação entre atores políticos historicamente antagônicos não daria certo.

Ao assumir a presidência, Néstor Kirchner desafiou o FMI e renegociou a dívida externa do país. O lulismo segue favorecendo os banqueiros que se locupletam com o nosso suado dinheiro, que se transforma de impostos em pagamento dos juros da dívida pública antes que você consiga pronunciar Supercalifragilisticoespialidoso. Néstor também enfrentou a Suprema Corte, o que levou à revisão da lei de anistia e à consequente condenação dos torturadores do Regime Militar. Sua viúva Cristina, por sua vez, enfrentou o poderosíssimo conglomerado de mídia Grupo Clarín. Mesmo sofrendo um revés nas eleições parlamentares, ela não voltou atrás no projeto da Ley de Medios. Com isso, a Argentina dinamitou de uma vez por todas as bases sociais do golpismo (como bem notou Ariel Palácios ao comparar os protestos anti-Dilma e anti-Cristina, ninguém lá pede a volta dos militares). O lulismo, por sua vez, com sua obsessão fanática pela conciliação, não se propôs a enfrentar o status quo brasileiro em momento algum e agora vê seu capital político desabar em meio a sandices populistas que vão de pedidos de golpe militar a ameaças contra a vida da presidente. O grande erro do lulismo foi não insistir nas suas propostas e engavetá-las ao primeiro grito de oposição dos atores conservadores (ex: PNDH-3, Comissão de Jornalismo, etc.). E também de achar que seria possível "comprar", através de fartas verbas publicitárias, uma imprensa que se assemelha cada dia mais à Aurora Alemã, jornal do Partido Nazista no Sul do Brasil.

Além disso tudo, madame K ainda enfrentou outro ator poderosíssimo: a Igreja Católica, que ainda é a oficial do país (na figura do então Arcebispo de Buenos Aires, Jorge Mario Bergoglio, atual Papa Francisco), ao propor a legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo. Para não ser injusto, o PT também apresentou a proposta, mas no longínquo ano de 1995! E a deixou para lá quando chegou ao poder em prol da conciliação com grupos evangélicos conservadores que sempre falaram que Lula é a reencarnação do capiroto. A despeito de uma situação econômica tão delicada quanto a do Brasil (a inflação na Argentina é o dobro da nossa), Cristina vai muito bem, obrigado. Ao contrário do que promotores de Justiça populistas e atores e comediantes canastrões tentam fazer com a imagem dela e a despeito dos desejos mais profundos do jornal O Globo - parceiro fiel do Grupo Clarín - la señora presidenta deve eleger seu sucessor, o governador de Buenos Aires Daniel Scioli, nas eleições presidenciais desse ano, a serem realizadas em 25 de outubro. Scioli lidera as pesquisas de intenção de voto desde meados de maio. O governo da Argentina bateu de frente com o conservadorismo social de sua sociedade e o Partido Justicialista colhe os louros disso. O governo do Brasil ainda acha que é possível dialogar com esse mesmo conservadorismo e o Partido dos Trabalhadores, sem identificação no povo ou na elite, desaba.

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